domingo, 16 de maio de 2010

VIDA MORNA (conto meu)

             
               Chego tarde, como sempre. Meu marido, na cozinha, toma um café enquanto prepara
nossa janta. E, igual a sempre, pergunta como foi meu dia. Respondo ótimo, trabalhei bastante. Não posso contar que deixei o escritório cedo, e fui ao encontro da turma. Minha turma de mulheres, há alguns dias resolveu extrapolar, e, depois de seduzir aquele stripper, uma delas levou-o para casa. Levou-o não, levamos: eu fiz parte de cada sórdido detalhe. Depois de o exaurirmos a sexo e álcool, alguém lançou a ideia. E ela ficou suspensa no ar. De início, dissemos não, nem pensar. Mas, ela ficou ali, rondando. Não escaparíamos dela.
               - Queres mais um cafezinho, amor? - pergunta meu marido, arrancando-me do devaneio.
               Começo a bebericar aquele café quentinho, e, enquanto ele conta sobre seu dia, quase igual a todos os dias, volto ao desigual do meu. Pois a ideia ficara ali e, por mais que tentássemos evitá-la, não nos deu mais sossego. Eu não sabia por que iríamos fazer aquilo com ele, mas sabia que o faríamos.
               Enquanto não acontecia, o homem ficara amarrado à cama de nossa amiga. Por vários dias. Nós o tratávamos bem, vinho, boa comida, sexo. Ele, prisioneiro. Meio que gostando daquilo tudo, meio que temendo o momento seguinte.
               - O café vai esfriar - diz meu marido, novamente me trazendo para nossa casa.
               Dou alguns goles. Sinto-me inquieta. Meu pensamento foge dali.
               Resolveramos, as amigas, que o desenlace seria hoje. E fomos em frente.
               - A janta ainda demora? - pergunto.
               Quando ele diz 20 minutos, decido tomar um banho. A água que escorre pelo meu corpo, limpa qualquer vestígio de sangue. Penso na cena em que o matamos. Ele se desesperou, incrédulo, e nós batemos sem piedade. Mais e mais, tanto mais ele se debatia.
Quando aquietou-se, quase morto, fui eu quem abriu a bolsa e o atingiu, com vários disparos.
Não podia deixar pedra sobre pedra.

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